Por Silvana de Oliveira – Perita Judicial, Grafotécnica, Especialista em Provas Digitais e Investigação Forense
No julgamento dos autos nº 0020178-52.2024.5.04.0111, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região manteve a decisão de primeiro grau e indeferiu a utilização de prints de conversas de WhatsApp como meio de prova, por entender que faltavam registros válidos que assegurassem a autenticidade e integridade do material apresentado. O fundamento principal: a ausência da cadeia de custódia.

Essa decisão ganha destaque por tratar de um tema cada vez mais presente nos litígios contemporâneos — a validade e a confiabilidade das provas digitais, especialmente em um cenário onde aplicativos de mensagens instantâneas se tornaram canais comuns de comunicação profissional e contratual.
A Cadeia de Custódia como Garantia da Autenticidade
A Corte Trabalhista reforçou que a força probante dos prints está diretamente vinculada à comprovação da autenticidade da imagem, o que demanda, necessariamente, a preservação da cadeia de custódia. Esse conceito, importado do campo criminal e agora amplamente aplicado nos demais ramos do Direito, assegura que a evidência — do momento de sua coleta até sua análise judicial — permaneça íntegra, rastreável e livre de manipulações. Sem esse controle, não é possível garantir que a prova digital apresentada corresponde exatamente ao conteúdo original, o que compromete a confiabilidade do elemento probatório.
Por que a simples captura de tela não é suficiente
A decisão do TRT deixa claro que a utilização isolada de prints de conversas como única prova deve ser vista com cautela, pois esses documentos são facilmente editáveis ou manipuláveis com ferramentas simples. Diferente de documentos físicos assinados, os prints digitais não possuem, por si sós, validade técnica, a menos que estejam acompanhados de:
- Metadados (data, hora, autor, dispositivo de origem);
- Assinaturas digitais ou hashes criptográficos;
- Relatórios técnicos de extração forense (por exemplo, via software como Cellebrite ou Magnet AXIOM);
- Registro em blockchain ou plataformas certificadoras com timestamp (por exemplo inspireip)
Segurança Jurídica e Responsabilidade Técnica na Produção da Prova Digital
A decisão reafirma a necessidade de profissionalização na coleta e preservação de provas digitais. Isso se aplica tanto ao campo do Direito quanto ao da perícia técnica. O Judiciário vem amadurecendo a compreensão de que a informalidade na apresentação de provas digitais pode comprometer a veracidade dos fatos alegados. Ao vedar o uso dos prints desprovidos de validação técnica, o TRT da 4ª Região estabelece um marco relevante: a admissibilidade da prova digital depende da sua conformidade com os princípios da autenticidade, integridade e rastreabilidade.
Implicações Práticas para o Processo do Trabalho
No âmbito trabalhista, é comum que as partes tentem comprovar ordens, comunicações ou faltas por meio de mensagens via WhatsApp. Porém, sem uma coleta adequada e uma cadeia de custódia preservada, esses elementos correm o risco de serem desconsiderados pelo Judiciário.
Essa realidade impõe aos advogados e peritos:
- A orientação preventiva às partes quanto à forma correta de registrar e preservar comunicações relevantes;
- A solicitação de perícia técnica quando houver controvérsia sobre a veracidade de mensagens;
- O cuidado ao apresentar provas digitais como elemento exclusivo de convencimento.
A decisão do TRT da 4ª Região, ao reafirmar a importância da cadeia de custódia, não nega a relevância das provas digitais, mas exige que estas sejam tratadas com rigor técnico e jurídico. Em tempos de fácil manipulação de imagens e informações, a credibilidade da prova passa a depender não apenas do que é dito, mas de como e por quem foi documentado. O julgamento nos autos nº 0020178-52.2024.5.04.0111 serve como alerta e orientação: o futuro da prova digital é técnico, documentado e rastreável. A informalidade, por si só, já não encontra abrigo seguro no processo judicial.
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