Por Silvana de Oliveira – Perita Judicial, Grafotécnica, Especialista em Provas Digitais e Investigação Forense
A validade da notificação extrajudicial por e-mail para caracterização da mora do devedor fiduciante
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou recente entendimento de grande relevância para o campo do Direito Contratual e Processual Civil: a notificação extrajudicial realizada por e-mail é válida1 para caracterizar a mora do devedor fiduciante, desde que observados critérios mínimos de formalidade e segurança da informação. Esse posicionamento foi consolidado no julgamento do Recurso Especial que discutia a legalidade da notificação por correio eletrônico em ações de busca e apreensão com base no Decreto-Lei 911/1969, após a alteração promovida pela Lei 13.043/2014.
O caso concreto e a controvérsia jurídica
No processo analisado, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) deferiu liminar de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente, após o credor comprovar o envio da notificação por e-mail ao endereço eletrônico constante no contrato. O devedor, por sua vez, alegou que a notificação feita exclusivamente por e-mail não teria validade jurídica suficiente para configurar sua mora, defendendo a necessidade de carta registrada com aviso de recebimento.
A controvérsia girava, portanto, em torno da interpretação do artigo 2º, §2º, do Decreto-Lei 911/19692, que trata da exigência de notificação do devedor como condição prévia para o ajuizamento da ação de busca e apreensão.
O entendimento do STJ: tecnologia e segurança jurídica
Relator do recurso, o ministro Antonio Carlos Ferreira destacou que a legislação vigente já prevê meios alternativos à carta registrada – como o protesto do título – e que a evolução tecnológica não pode ser ignorada pelo Direito.
Segundo o voto vencedor, se houver comprovação objetiva de que o e-mail foi enviado ao endereço eletrônico fornecido no contrato e que foi recebido, o ato se reveste de validade para fins de comprovar a mora.
Ou seja, o foco não está apenas na forma, mas na efetividade da comunicação.
O relator reconheceu que, embora ainda não exista um sistema oficial de comprovação de leitura de e-mails no Brasil, é possível suprir tal lacuna com evidências sólidas e verificáveis, como logs de envio, comprovantes de leitura automática, registros de entrega e auditorias técnicas.
Precedentes e jurisprudência consolidada
O STJ também relembrou que, no Tema 1.132 dos recursos repetitivos3, fixou-se que é válida a notificação enviada ao endereço indicado no contrato, independentemente de quem a receba.
Assim, o mesmo raciocínio pode ser aplicado analogicamente ao ambiente digital, desde que o e-mail conste expressamente no contrato firmado entre as partes e haja prova da entrega da mensagem.
agilidade, economia e segurança
Essa decisão representa um avanço importante em termos de modernização do processo civil e de adaptação do sistema jurídico à realidade tecnológica da sociedade contemporânea. Ao reconhecer a validade da notificação por e-mail, o STJ prestigia princípios como a razoável duração do processo, a eficiência da prestação jurisdicional e a redução de custos processuais — elementos fundamentais para um Judiciário mais acessível e eficaz. Além disso, oferece segurança jurídica às partes que, de forma transparente e consensual, optam por meios eletrônicos de comunicação em seus contratos.
o digital como meio legítimo de notificação
A decisão da Segunda Seção do STJ alinha-se ao espírito da legislação moderna, que busca compatibilizar os avanços tecnológicos com a rigidez formal do processo civil.
A notificação extrajudicial por e-mail, portanto, é válida para caracterizar a mora do devedor fiduciante, desde que:
- O endereço eletrônico esteja previsto no contrato;
- Haja prova do envio e do recebimento da mensagem;
- O conteúdo da notificação seja claro e inequívoco.
Esse entendimento representa mais do que uma mudança interpretativa: é um passo firme rumo à digitalização responsável da Justiça brasileira.
- Leia o acórdão no REsp 2.183.860.
- Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 2183860
- Notificação extrajudicial por email é válida https://goo.su/y0Lzkh ↩︎
- Decreto-Lei 911/1969 https://goo.su/U9PZ ↩︎
- Tema 1.132 dos recursos repetitivos https://goo.su/IznIW ↩︎
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