Sem URL, Sem Multa: STJ Redefine Responsabilidades de Provedores na Remoção de Conteúdos

Por Silvana de Oliveira

A decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em dispensar um provedor de internet da multa diária por não ter removido conteúdo ofensivo, devido à falta de indicação do URL na petição inicial, traz à tona importantes reflexões sobre a responsabilidade dos provedores de internet, o cumprimento de ordens judiciais e a importância das provas digitais na construção de um título executivo judicial.

Contexto da Decisão

No caso em questão, o autor da ação buscava a retirada de uma notícia considerada ofensiva à sua honra. Contudo, a ausência de indicação do URL na petição inicial resultou em um cenário onde o provedor não poderia, de forma efetiva, cumprir a ordem judicial. A decisão do STJ fundamentou-se no princípio da substitutividade, uma vez que uma nova determinação judicial impôs condições para a obrigação de remoção, a qual foi cumprida apenas após o conteúdo já ter sido excluído.

Análise das Provas Digitais

As provas digitais desempenham um papel crucial nesse contexto, principalmente no que diz respeito à responsabilização dos provedores de internet. A necessidade de indicar o URL específico do conteúdo ofensivo reflete a importância da precisão na identificação de informações na vasta rede de dados que compõe a internet. Sem essa indicação clara, a capacidade do provedor de cumprir uma ordem judicial fica comprometida, levando a decisões que podem ser vistas como injustas.

A decisão do STJ também ressalta que a mera ausência de uma indicação precisa não deve resultar automaticamente em penalizações severas, como a multa diária, especialmente quando há uma decisão judicial posterior que modifica a situação. Isso promove uma abordagem mais equilibrada, levando em conta tanto os direitos do autor da ação quanto as limitações práticas enfrentadas pelos provedores de internet.

Implicações Jurídicas

A interpretação do STJ enfatiza a necessidade de rigor na formulação de pedidos judiciais, uma vez que a eficácia das decisões depende da clareza e especificidade das solicitações. Isso implica que, em ações relacionadas a conteúdos digitais, os advogados e partes envolvidas devem estar atentos à necessidade de apresentar provas e informações suficientes para embasar suas reivindicações.

Além disso, a decisão reforça a importância do diálogo entre as decisões judiciais e a realidade da internet, onde o fluxo de informações é dinâmico e, muitas vezes, fugaz. A adaptabilidade do sistema jurídico frente à realidade digital é fundamental para garantir que a justiça seja efetiva e equitativa.

A dispensação da multa ao provedor de internet pelo não cumprimento de uma ordem judicial, devido à falta de especificidade na petição inicial, ressalta a necessidade de clareza nas solicitações judiciais e a importância das provas digitais para o fortalecimento da segurança jurídica. A decisão do STJ não apenas protege os provedores de penalidades injustas, mas também destaca o papel vital que as provas digitais desempenham na mediação de conflitos na era da informação, onde a identificação precisa de conteúdos é fundamental para a aplicação da justiça. A interação entre o direito e o digital continua a evoluir, exigindo um contínuo aprimoramento das práticas legais e da legislação pertinente.


Provedor é dispensado de multa diária por não ter removido conteúdo sem indicação do URL

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) dispensou um provedor de internet do pagamento de multa por não ter removido, no prazo determinado pelo juízo, certo conteúdo considerado ofensivo. Segundo o colegiado, se uma decisão posterior da Justiça modifica as circunstâncias de aplicação da multa diária por descumprimento de obrigação (astreintes), ela substitui a decisão original e consolida os requisitos para a constituição de eventual título executivo judicial.

O entendimento se baseou no princípio da substitutividade, já que uma decisão do próprio STJ havia condicionado a obrigação de remover o conteúdo à indicação do URL da página, e essa condição só foi cumprida quando o conteúdo já estava removido.

Na origem do caso, o autor da ação exigiu que uma notícia ofensiva à sua honra fosse retirada da internet, mas a petição inicial não indicou o URL da página. Mesmo assim, o juízo concedeu liminar – depois confirmada na sentença – determinando que a notícia fosse retirada da rede em 48 horas, sob pena de multa diária de R$ 5 mil.

Notícia foi retirada dois meses após a liminar

Foi nessa fase do processo que o STJ confirmou a responsabilidade do provedor pela remoção do conteúdo, desde que informado o URL.

Como o conteúdo só foi removido cerca de dois meses depois da concessão da liminar, o autor da ação, pretendendo receber o valor acumulado da multa, deu início à fase de cumprimento de sentença, mas o juízo acolheu a impugnação e, com respaldo na decisão do STJ, apontou que a indicação do URL era um requisito necessário para a incidência da multa. O tribunal de segunda instância manteve essa decisão.

No novo recurso ao STJ, o autor insistiu na possibilidade de cobrar a multa acumulada no período em que não houve o cumprimento da liminar, ainda que, ao longo desse tempo, o provedor desconhecesse o URL da página a ser removida.

Decisão final substitui a que determinou a obrigação

A relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que o princípio da substitutividade, previsto no artigo 1.008 do Código de Processo Civil (CPC), tem especial relevância nas discussões sobre multa por descumprimento de ordem judicial, pois a decisão final do processo é prejudicial em relação à decisão que determinou a obrigação não cumprida.

Por isso mesmo, segundo ela, o STJ, em julgamento de recurso repetitivo, fixou a tese de que as decisões que impõem multa diária não precluem e não fazem coisa julgada (Tema 706).

Quanto à necessidade de indicação do URL para a remoção de conteúdo tido por ofensivo, Nancy Andrighi disse que esse já era o entendimento da jurisprudência do STJ antes mesmo da vigência da lei que instituiu o Marco Civil da Internet. Para a relatora, essa orientação tem o objetivo de garantir maior grau de precisão acerca do conteúdo que deve ser removido. Caso contrário, “é possível que ocorram remoções injustificadas, violando as garantias constitucionais de liberdade de expressão, acesso à informação e vedação da censura”.

Segundo a ministra, a substituição da sentença pela posterior decisão do STJ no caso limitou a responsabilidade do provedor, estipulando a obrigação de remover o conteúdo desde que fosse fornecido o URL. Uma vez que o endereço da página só foi apresentado após a remoção do conteúdo, a relatora concluiu que não houve descumprimento da ordem judicial e entendeu ser descabida a aplicação da multa coercitiva.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/03102024-Provedor-e-dispensado-de-multa-diaria-por-nao-ter-removido-conteudo-sem-indicacao-do-URL.aspx?utm_source=brevo&utm_campaign=Edio%20de%203102024&utm_medium=email