A decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que a ação de produção antecipada de prova pericial pode ser ajuizada na comarca onde se encontra o objeto a ser periciado, independentemente do foro eleito em contrato, apresenta importantes reflexões sobre a interpretação das normas processuais e a busca pela eficiência na prestação jurisdicional.
Contexto e Fundamento Legal
A produção antecipada de prova é disciplinada no artigo 381 do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, sendo um instrumento destinado à preservação de provas que possam se tornar indisponíveis com o tempo ou que sejam essenciais para a definição de direitos futuros. Trata-se de uma medida preventiva que não busca a resolução do mérito, mas apenas garantir a integridade da prova.
A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que essa modalidade de ação não tinha equivalente direto no CPC de 1973, o que torna essencial sua interpretação à luz do novo ordenamento. No caso julgado, o STJ concluiu que, em situações em que o objeto da perícia se encontra em local diverso do foro eleito contratualmente, deve prevalecer a comarca onde o equipamento está localizado. Essa interpretação privilegia a efetividade da justiça e a economia processual, considerando a necessidade prática de acesso ao objeto para a realização da perícia.
Conflito de Jurisdição: Foro Eleito x Local da Perícia
A questão central do julgamento envolveu o confronto entre o foro de eleição contratual e a jurisdição territorial onde se encontrava o equipamento. O foro de eleição é válido e vinculante entre as partes, conforme o artigo 63 do CPC, mas o STJ entendeu que sua aplicação não deve impedir a realização de medidas que dependam da proximidade física com o objeto da ação.
No caso concreto, a ação foi ajuizada na comarca onde estava o equipamento a ser periciado, uma escolha que se justifica pela praticidade e viabilidade técnica. Realizar a perícia em local distante poderia acarretar custos adicionais, dificultar o trabalho do perito e comprometer a celeridade processual. Assim, o tribunal adotou uma visão pragmática, equilibrando o respeito ao foro de eleição com as demandas da realidade probatória.
Implicações da Decisão
- Prevalência da Efetividade Processual: A decisão reforça que a eficiência e a viabilidade prática do processo devem ser priorizadas, especialmente em ações que visam exclusivamente à produção de prova.
- Flexibilidade na Aplicação do Foro Eleito: Embora o foro de eleição seja respeitado, a decisão demonstra que ele pode ser relativizado em circunstâncias específicas que demandem outra jurisdição para assegurar a adequada instrução do processo.
- Interpretação Evolutiva do CPC: A ênfase na utilidade da produção antecipada de provas reflete uma leitura moderna do CPC, alinhada com os princípios de duração razoável do processo e acesso à justiça.
- Impacto para Litigantes e Contratos: Empresas e indivíduos devem estar atentos à possibilidade de que, mesmo havendo cláusula de foro contratual, a jurisdição possa ser deslocada quando houver necessidade prática de realização de atos processuais.
A decisão do STJ é um marco na compreensão da produção antecipada de provas, equilibrando normas contratuais e processuais com a efetividade e celeridade da justiça. Ao privilegiar a comarca onde se encontra o objeto da perícia, o tribunal garantiu não apenas a preservação da prova, mas também o acesso facilitado ao procedimento, em consonância com os valores fundamentais do processo civil contemporâneo.
Ação de produção antecipada de prova pode ser ajuizada na comarca onde está o objeto
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que a ação de produção antecipada de prova pericial pode ser processada na comarca onde está o objeto que vai ser periciado, e não no local de domicílio da parte ré — que, no caso julgado, coincidia com o foro eleito em contrato.
Segundo o processo, foi movida ação de produção antecipada de prova contra uma metalúrgica, para que fosse feita a perícia de um equipamento fornecido por ela, o qual se encontrava na sede de uma empresa cliente da autora.
A ação foi ajuizada na comarca onde se encontrava o equipamento, enquanto o foro eleito no contrato entre autora e ré era o de domicílio desta última.
Após o tribunal de segunda instância não acolher a tese proposta pela ré em exceção de incompetência, a metalúrgica recorreu ao STJ sustentando que a cláusula contratual de eleição de foro deveria prevalecer.
A relatora, ministra Nancy Andrighi, observou que a possibilidade de pedir a produção antecipada de prova ao juízo do local onde ela deva ser produzida, prevista no artigo 381, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), não tinha equivalente no CPC/1973, o qual estabelecia como regra geral que a competência para a ação cautelar era do juízo competente para a ação principal (artigo 800 do CPC/1973).
Apesar disso, acrescentou a ministra, antes mesmo da vigência do CPC/2015, o STJ já vinha admitindo a flexibilização dessa competência em relação aos procedimentos cautelares, sobretudo quando se tratasse de produção antecipada de provas, por uma questão de praticidade.
“A facilitação da realização da perícia prevalece sobre a regra geral do ajuizamento no foro do réu por envolver uma questão de ordem prática, tendo em vista a necessidade de exame no local onde está situado o objeto a ser periciado”, completou.
A relatora destacou ainda que o artigo 381, parágrafo 3º, do CPC/2015 prevê expressamente que o foro no qual tramitar a ação cautelar de produção de prova não ficará prevento para a futura ação principal. Assim, segundo ela, afasta-se qualquer ideia de prejuízo à parte ré, pois, caso seja ajuizada a ação principal, o foro eleito no contrato — que coincide com o local de sua sede — poderá prevalecer. Com informações da assessoria de comunicação do STJ.
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REsp 2.136.190
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