Justiça Anula Ação por Falha Processual: Quando a Falta de Provas Compromete a Defesa

Por Silvana de Oliveira

A decisão proferida pela 9ª Câmara Criminal Especializada do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) Processo 0008169-62.2022.8.13.0035 destaca a relevância da regularidade processual e da observância aos princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. A nulidade parcial do processo, decretada em razão da ausência da gravação audiovisual da audiência de instrução e julgamento e de sua respectiva transcrição, reforça a necessidade de garantia plena à defesa do réu.

O entendimento firmado pela desembargadora Valéria Rodrigues, relatora do recurso de apelação, encontra respaldo no artigo 564, inciso IV, do Código de Processo Penal, que prevê nulidade processual quando houver omissão de formalidade essencial ao ato. A ausência da gravação ou transcrição inviabilizou a revisão da autoria delitiva pelo colegiado, comprometendo o duplo grau de jurisdição e fragilizando o princípio da ampla defesa.

Um ponto relevante é que a preliminar de nulidade foi levantada pela Procuradoria-Geral de Justiça, e não pela defesa, evidenciando que a falha processual era manifesta e incontornável. A diligência determinada pela relatora confirmou a impossibilidade de acesso ao link da audiência, em razão de erro e expiração, além da inexistência de cópia física da gravação e da transcrição do ato.

A matéria também suscita reflexões sobre a importância da preservação e acessibilidade das provas processuais, especialmente em tempos de digitalização dos atos judiciais. A falha na conservação dos registros audiovisuais compromete a segurança jurídica e pode ensejar o refazimento de atos processuais, retardando a efetivação da justiça.

Por fim, o caso reforça a necessidade de aprimoramento dos mecanismos de registro e arquivamento dos atos processuais, garantindo que as partes tenham acesso integral ao material probatório, assegurando a transparência e a legitimidade das decisões judiciais.

Exemplos

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – HOMICÍDIO QUALIFICADO – FALHA NA GRAVAÇÃO DE DEPOIMENTOS – NULIDADE ABSOLUTA – CONFIGURAÇÃO. – A falha na gravação de depoimentos judiciais, que impossibilita a compreensão da prova produzida, enseja a nulidade absoluta do processo, por violar os princípios do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal e do duplo grau de jurisdição.

(TJ-MG – APR: XXXXX40326045001 Montes Claros, Relator.: Marcos Flávio Lucas Padula, Data de Julgamento: 23/11/2021, Câmaras Criminais / 5ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 01/12/2021)


Ação é anulada por falta de mídia da audiência e transcrição dos depoimentos

A falta nos autos do processo da mídia audiovisual da audiência de instrução e julgamento, bem como de sua transcrição, cerceia a defesa. Com esse entendimento, a 9ª Câmara Criminal Especializada do Tribunal de Justiça de Minas Gerais decretou a nulidade parcial de uma ação, a partir do ato que não ficou registrado.

TJ mineiro anulou parte do processo em que se perdeu a gravação da audiência

“Não havendo nos autos transcrição oficial do conteúdo dos referidos relatos, entendo ser latente a nulidade parcial do feito, levando em consideração a ocorrência de cerceamento de defesa e ofensa aos princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal e do duplo grau de jurisdição”, destacou a desembargadora Valéria Rodrigues, relatora do recurso de apelação interposto pelo réu.

Conforme a julgadora, a ausência da mídia e/ou da transcrição frustrou a possibilidade de o colegiado apreciar a autoria delitiva, questionada na apelação. Em seu parecer, a Procuradoria-Geral de Justiça suscitou a preliminar de nulidade parcial do processo, embora a própria defesa não tenha feito isso em suas razões recursais.

A relatora fundamentou o seu voto na jurisprudência do TJ-MG e no inciso IV do artigo 564 do Código de Processo Penal, que dispõe sobre a hipótese de nulidade “por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato”. A posição de Valéria Rodrigues foi acompanhada pelos desembargadores Maria das Graças Rocha Santos e Walner Barbosa Milward de Azevedo.

Durante a apreciação do recurso, a relatora determinou ao cartório uma diligência, que confirmou a impossibilidade de acesso ao link da audiência por ele conter erro e ter expirado. O setor de informática do tribunal apurou esses problemas. Também foram detectadas as ausências de cópia física da mídia e de transcrição do ato processual.

A ação versa sobre o crime de ameaça, sendo o réu condenado a um mês e dez dias de detenção, em regime inicial aberto, e ao pagamento de indenização de R$ 2 mil por danos morais. A defesa pleiteou no recurso a absolvição, com a alegação de que houve ofensas recíprocas entre o acusado e a vítima em momento de exaltação de ambos, não havendo “concretude” nas supostas ameaças.

Na apelação também foi pedido o afastamento da condenação por dano moral, por não haver solicitação expressa de indenização e nem discussão sobre o seu valor. A audiência de instrução e julgamento se ateve apenas à suposta ameaça, sendo colhidos os depoimentos da vítima e de duas testemunhas, e promovido o interrogatório do réu. Processo 0008169-62.2022.8.13.0035

Fonte: https://www.conjur.com.br/2025-mar-29/acao-e-anulada-por-falta-de-midia-da-audiencia-e-transcricao-dos-depoimentos/