PixBaby: Reconhecimento de Paternidade via PIX

Por Silvana de Oliveira  Perita Judicial, Grafotécnica, Especialista em Provas Digitais e Investigação Forense

O reconhecimento de paternidade é um direito fundamental que assegura ao filho o direito ao nome, à herança e ao afeto do pai. Tradicionalmente, esse processo envolve registros cartoriais ou exames de DNA. No entanto, um caso recente trouxe à tona uma abordagem inovadora: o uso do sistema de pagamentos instantâneos PIX para identificar e confirmar a paternidade.

O Caso do “PixBaby”

Em junho de 2022, uma advogada baiana, Mylla Christie, foi procurada por uma mulher grávida que desejava identificar o pai de seu bebê. A única informação disponível era o primeiro nome do suposto pai e seu número de telefone. Após ser bloqueada pelo homem ao informar sobre a gravidez, a mulher recorreu à advogada em busca de soluções.

Mylla utilizou o número de telefone fornecido para rastrear o PIX do homem. A partir dos dados da conta, conseguiu acessar informações como nome completo e CPF do suposto pai. Com essas informações, localizou o homem nas redes sociais e confirmou que ele era casado. Posteriormente, um exame de DNA confirmou que ele era o pai da criança, e ele se comprometeu a registrar o bebê e assumir suas responsabilidades legais.

Produção Antecipada de Provas e Perícia Forense

Em casos como esse, a perícia forense pode atuar de forma decisiva na produção antecipada de provas, garantindo a integridade e a validade das informações obtidas antes de uma ação judicial formal. Por exemplo, dados extraídos de transações via PIX ou de redes sociais podem ser coletados por um perito digital, seguindo protocolos rigorosos de cadeia de custódia e preservação de evidências.

A atuação do perito forense assegura que informações sensíveis, como registros bancários e digitais, sejam apresentadas de forma técnica e juridicamente válida, fortalecendo a prova em eventual processo de reconhecimento de paternidade. Além disso, evita questionamentos futuros sobre a autenticidade ou manipulação de dados, conferindo segurança jurídica tanto à mãe quanto ao suposto pai.

Implicações Legais e Tecnológicas

O caso levanta questões sobre privacidade e segurança de dados pessoais. O uso do PIX para identificar indivíduos sem o seu consentimento deve respeitar o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). A atuação da perícia forense ajuda justamente a equilibrar a obtenção de provas com a observância das normas legais, promovendo uma investigação ética e segura.

Titularidade dos dados

No caso do PIX, os dados expostos — como CPF, nome completo, e eventualmente telefone ou e-mail — pertencem ao usuário da conta. Ele é o titular dos dados pessoais, conforme definido pela LGPD (Lei nº 13.709/2018).

Mesmo que esses dados estejam “acessíveis” por meio de transações ou apps bancários, isso não dá automaticamente permissão para qualquer terceiro usá-los para identificar a pessoa sem consentimento. Ou seja, o direito à privacidade e à proteção dos dados continua.

Responsabilidade sobre o uso

A LGPD estabelece que qualquer tratamento de dados pessoais precisa ter base legal. Algumas bases que poderiam ser alegadas em casos jurídicos são:

  • Cumprimento de obrigação legal ou regulatória (não se aplica diretamente aqui, a não ser que seja decisão judicial).
  • Exercício regular de direito (como defesa em ação judicial).
  • Proteção da vida ou tutela da saúde (quando aplicável).

No caso do “PixBaby”, a advogada utilizou os dados para localizar o suposto pai. Tecnicamente, esse tipo de tratamento de dados sem consentimento poderia ser questionado se não estivesse amparado por decisão judicial ou enquadrado em exceção legal, porque o acesso aos dados do PIX não é público.

Isso é essencial porque o objetivo é provar a paternidade, mas respeitando os direitos do titular dos dados.

O caso do “PixBaby” ilustra como a tecnologia pode ser integrada à prática jurídica para resolver questões complexas, como o reconhecimento de paternidade. A perícia forense, especialmente na produção antecipada de provas, atua como um suporte técnico essencial, garantindo que informações digitais sejam coletadas, preservadas e apresentadas de forma confiável. Essa combinação de inovação tecnológica e rigor pericial abre caminho para soluções mais rápidas, seguras e juridicamente robustas.