Quando a assinatura “desaparece” no PJe

Por Silvana de Oliveira  Perita Judicial, Grafotécnica, Especialista em Provas Digitais e Investigação Forense

No ambiente digital, especialmente dentro dos sistemas de processo eletrônico, é muito comum que profissionais do Direito se deparem com um cenário intrigante: o documento é enviado ao PJe com uma assinatura digital válida, mas, depois do upload, a assinatura simplesmente “some” do PDF1.

Esse estranhamento nasce, em grande parte, da confusão entre três categorias de assinaturas que muitos tratam como sinônimas, embora sejam profundamente distintas — digital, eletrônica e digitalizada. Entender essas diferenças é o primeiro passo para compreender por que o PJe remove as assinaturas incorporadas nos PDFs.

Três categorias, três níveis de confiabilidade

Para navegar nesse universo, vale visualizar cada tipo de assinatura como “camadas de robustez”, da mais frágil à mais forte.

Assinatura digitalizada

É apenas a imagem da assinatura manuscrita colocada num documento eletrônico.
Não há criptografia, certificado ou vínculo técnico com o signatário.
É semelhante a anexar uma foto da sua assinatura — esteticamente reconhecível, mas juridicamente frágil.
Seu valor probatório depende de outros elementos externos.

Assinatura eletrônica

É o gênero mais amplo. Envolve qualquer mecanismo eletrônico capaz de expressar a vontade e identificar o signatário:

  • login e senha,
  • aceite por clique,
  • biometria,
  • token, SMS ou múltiplos fatores de autenticação.

Aqui já existe um nível técnico que permite identificar quem assinou e confirmar a integridade do documento.

Assinatura digital (ICP-Brasil)

É a “nata” das assinaturas.
Utiliza criptografia assimétrica e certificados emitidos pela ICP-Brasil, garantindo:

  • autenticidade,
  • integridade,
  • não repúdio.

É o padrão mais forte e mais protegido pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Bases legais: de onde vem a força jurídica

A Medida Provisória nº 2.200-2/2001 criou a ICP-Brasil e reconheceu validade plena aos documentos assinados digitalmente.

Mas o art. 10, §2º da mesma MP abriu um caminho importante: o pluralismo tecnológico. Ou seja, é possível usar outros meios de comprovação de autoria e integridade, desde que aceitos pelas partes.

Depois dela vieram normas que organizaram a hierarquia dos tipos de assinatura:

Lei 14.063/2020

Classificou as assinaturas eletrônicas para uso no setor público em três níveis:

  • Simples
  • Avançada
  • Qualificada (ICP-Brasil)

Decreto 10.278/2020

Estabeleceu requisitos para digitalização e confirmou que a assinatura qualificada garante autenticidade equivalente ao documento físico. Esse conjunto normativo forma a espinha dorsal da validade jurídica de atos eletrônicos.

Por que a assinatura desaparece no PJe?

Aqui está o ponto que mais causa confusão — mas a explicação é essencialmente técnica.

O PJe não mantém o PDF original

Quando um documento assinado digitalmente é anexado, o sistema:

  1. converte o arquivo para outro formato (geralmente PDF/A),
  2. remove camadas, objetos e elementos binários — incluindo a assinatura,
  3. gera um novo hash interno, armazenado no banco de dados.

Conclusão: O arquivo que você vê no PJe não é o mesmo que você enviou. Visualmente pode ser idêntico, mas, para fins criptográficos, é outro documento.

E a assinatura digital só é válida sobre o arquivo original, byte a byte. Assim, qualquer alteração invalida a assinatura.

O PJe usa sua própria forma de garantir integridade

O sistema do CNJ substitui a certificação externa por mecanismos internos:

  • login com certificado digital para protocolar,
  • geração de hash próprio,
  • carimbo de tempo da juntada.

Ou seja, a assinatura interna do PJe é o ato que importa para fins processuais, e não a assinatura previamente inserida no PDF.

Base normativa

A Resolução CNJ 185/2013 exige assinatura digital dos atos processuais, mas adota formatos padronizados (como PDF/A), o que explica a normalização automática e a eliminação de elementos incompatíveis.

Como manter a assinatura visível quando for necessário

Há situações em que a assinatura visual precisa permanecer contratos, laudos, procurações, relatórios periciais etc. Para isso, existem alternativas:

Converter o documento em imagem

Transformar o conteúdo em PDF/A a partir de imagem impede o reprocessamento destrutivo. A assinatura visual permanece, mas a validação criptográfica não será preservada.

Anexar o arquivo original em formato ZIP

Alguns tribunais mantêm ZIPs intactos, sem conversão. Esse é o melhor caminho se você precisa preservar a assinatura digital original para eventual perícia.

O arcabouço brasileiro de assinaturas eletrônicas é sólido e plural, permitindo desde manifestações simples de vontade até mecanismos altamente seguros de certificação digital ICP-Brasil no ambiente do processo eletrônico:

  • a assinatura digitalizada não tem força própria,
  • a assinatura eletrônica depende da comprovação de integridade,
  • a assinatura digital ICP-Brasil continua sendo o padrão mais forte — mas não sobrevive ao reprocessamento técnico do PJe.

O sistema do CNJ cria um novo documento, com integridade garantida internamente.
Por isso a assinatura “desaparece” e, na prática, não há prejuízo jurídico, porque o ato processual fica validado pela assinatura do protocolo. Agora você já entende o motivo técnico desse comportamento e sabe como agir quando precisar preservar a assinatura na sua forma original.

  1. Fonte: https://www.conjur.com.br/2025-nov-14/quando-a-assinatura-desaparece-dos-documentos-no-processo-eletronico/#:~:text=Além%20disso%2C%20quanto%20se%20faz,que%20contexto%20podem%20ser%20utilizadas. ↩︎

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