Por Silvana de Oliveira – Perita Judicial, Grafotécnica, Especialista em Provas Digitais e Investigação Forense.
A 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, no julgamento do Processo nº 0003161-86.2020.8.16.0069, proferiu uma decisão unânime que se destaca pela proteção à acessibilidade e à dignidade nas relações de consumo. As instituições bancárias foram condenadas por firmarem contrato com uma pessoa com deficiência visual sem oferecer os cuidados necessários para assegurar informação adequada e consentimento válido.

Contratação irregular e vulnerabilidade ampliada
O caso envolve um consumidor com cegueira bilateral irreversível. Mesmo diante dessa condição, as instituições financeiras realizaram a contratação sem disponibilizar adaptações acessíveis que permitissem ao consumidor compreender o conteúdo do contrato.
Os bancos argumentaram que os valores estavam disponíveis na conta e que a documentação poderia ser acessada digitalmente. Contudo, o Tribunal reconheceu que, sem recursos de acessibilidade, o consumidor não tinha meios de ler, entender ou validar o contrato, o que comprometeu totalmente o consentimento. Diante disso, o negócio jurídico foi declarado nulo.
Dupla proteção jurídica: deficiência e relação de consumo
A decisão ressalta que pessoas com deficiência visual possuem dupla proteção:
- Enquanto pessoas com deficiência, protegidas pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015).
- Enquanto consumidores, amparados pelo Código de Defesa do Consumidor, que impõe o dever de informação clara, adequada e acessível.
O relator destacou que contratações realizadas com pessoas cegas não podem ser tratadas como atos ordinários, exigindo adaptação, atenção e mecanismos concretos de acessibilidade.
Princípios violados: informação, boa-fé e dignidade
O colegiado identificou três violações essenciais:
- Dever de informação – Fornecer documentos inacessíveis equivale a negar informação ao consumidor.
- Boa-fé objetiva – As instituições financeiras deixaram de agir com lealdade e transparência.
- Dignidade e igualdade – Sem adaptações, o consumidor foi colocado em posição de desvantagem injusta e discriminatória.
Impacto da decisão e orientações para o setor bancário
Ao declarar a nulidade do contrato, o TJPR reforça que a acessibilidade deve ser parte integrante dos procedimentos bancários não apenas uma recomendação, mas uma obrigação legal.
Entre as práticas necessárias estão:
- disponibilização de contratos em braile, áudio ou formatos compatíveis com leitores de tela;
- acompanhamento adequado por funcionário capacitado;
- linguagem acessível e clara;
- demonstração concreta de que o consumidor compreendeu o contrato antes de assinar.
A decisão fortalece a cultura da inclusão, afirmando que o direito à informação e à igualdade deve ser plenamente garantido em todas as etapas de contratação.
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