Sem Prova, Sem Júri: STF Travou o Júri – Boato Não É Prova

Por Silvana de Oliveira

“In Dubio Pro Reo”: STF Reafirma a Necessidade de Provas Mínimas para o Prosseguimento do Júri

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a realização de um júri popular fundamentado unicamente em declarações de terceiros que afirmaram “ouvi dizer” sobre a suposta participação do réu em um crime. A decisão reacende um dos pilares mais importantes do Direito Penal e Processual Penal brasileiro: o princípio do in dubio pro reo.

O que é o princípio “in dubio pro reo”?

Trata-se de um dos fundamentos do devido processo legal e da presunção de inocência, segundo o qual, na dúvida, deve-se decidir em favor do réu. Em outras palavras, se não houver certeza suficiente sobre a culpabilidade do acusado, ele não pode ser condenado — e, em alguns casos, nem sequer ser levado a julgamento popular, como ocorreu neste caso.

O caso concreto: ausência de prova mínima

A decisão do STF teve como fundamento a inexistência de prova mínima que justificasse a submissão do acusado ao Tribunal do Júri. As únicas “provas” apresentadas consistiam em relatos indiretos, do tipo “ouvi dizer que foi ele”, sem elementos objetivos, periciais ou testemunhais diretos que pudessem conferir alguma segurança jurídica ao processo. HABEAS CORPUS Nº 976863 – AL (2025/0020311-6.

O Supremo entendeu que essa base probatória, além de frágil, violava o direito do réu à ampla defesa e ao contraditório. A Corte reforçou que não se pode admitir um julgamento de tamanha gravidade — como o do júri — sem a devida comprovação mínima da materialidade e da autoria do crime.

Por que essa decisão é importante?

A decisão tem um valor simbólico e prático muito relevante:

  1. Reforça o compromisso com o Estado de Direito, onde ninguém deve ser julgado (ou condenado) apenas com base em suposições ou boatos;
  2. Valoriza a prova técnica e testemunhal qualificada, indispensáveis para garantir que o processo penal não se transforme em um instrumento de injustiça;
  3. Estabelece limites à atuação do Ministério Público e do Judiciário, exigindo que qualquer acusação esteja lastreada em elementos concretos e minimamente consistentes.

Implicações práticas para o sistema de justiça

A decisão alerta para a necessidade de rigor investigativo e prudência judicial. Para os operadores do Direito — advogados, promotores, magistrados e peritos —, reforça-se a importância de sustentar acusações e defesas com base em provas materiais, digitais, testemunhos confiáveis e exames técnicos, como os de grafoscopia e demais perícias forenses.

Além disso, protege o cidadão comum de ser indevidamente submetido ao peso de um processo penal, com todos os seus custos sociais, psicológicos e reputacionais, baseado apenas em conjecturas.

Ao suspender o júri por ausência de prova mínima, o STF não apenas aplicou corretamente o princípio in dubio pro reo, como também mandou um recado claro ao sistema judiciário: sem prova, não há julgamento. A justiça, para ser justa, precisa de fundamentos sólidos, e não de meros ecos do que “alguém ouviu dizer”.


“In dubio pro reo”

A expressão latina in dubio pro reo” significa “na dúvida, a favor do réu” (em tradução livre). Assim, o princípio do “in dubio pro reo” adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro expressa que, havendo dúvida no processo penal, por falta de provas, a interpretação do Juiz deve ser em favor do acusado.

Em outras palavras, se a acusação não conseguir apresentar provas que sejam suficientes para demonstrar que o crime ocorreu e quem foi o autor, o Juiz deverá absolver o réu.

A adoção desta regra de interpretação é uma expressão do princípio da presunção de inocência, presente no artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal, que diz que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

O princípio do “in dubio pro reo” está implicitamente adotado no Código de Processo Penal.

Veja o que diz a lei:

Código de Processo Penal – Decreto-lei nº 3.689/1974

Título XII

Da Sentença

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

(…)

VII – não existir prova suficiente para a condenação.

Fonte: https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/campanhas-e-produtos/direito-facil/edicao-semanal/201cin-dubio-pro-reo201d