Transparência e Privacidade: Solicitação de Dados pelo Ministério do Trabalho para Condomínios

Por Silvana de Oliveira

A solicitação de dados pelo Ministério do Trabalho é um tema relevante e envolve a disponibilização de bases de dados identificados contidos na Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) e no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED). Vamos analisar os principais pontos:

  1. Objetivo e Legislação:
    • O serviço visa permitir estudos estatísticos e afins, amparados pela Lei de Acesso à Informação (LAI), Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) e outras legislações aplicáveis.
    • Bases de dados identificados contêm informações pessoais que possibilitam a identificação direta ou indireta de indivíduos.
    • A utilização dessas informações por terceiros requer um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) ou Acordo de Cooperação (AC) com o órgão responsável, estabelecendo termos de sigilo e finalidade.
  2. Quem Pode Solicitar:
    • Qualquer cidadão, vinculado a um órgão público ou Organização da Sociedade Civil, pode fazer a solicitação.
    • Órgãos públicos devem firmar ACT, enquanto Organizações da Sociedade Civil utilizam AC.
  3. Procedimentos:

Em relação aos condomínios, recentemente houve polêmica sobre a solicitação de informações pessoais dos condôminos pelo Ministério do Trabalho para a campanha “Trabalho Doméstico Descente”. Essa prática suscitou dúvidas sobre a legalidade e a proteção dos dados pessoais dos moradores2. Vale a pena acompanhar os desdobramentos desse tema.

Em resumo, a solicitação de dados pelo Ministério do Trabalho envolve questões legais e de privacidade, e é importante garantir que os procedimentos sejam seguidos de acordo com a legislação vigente.12


Solicitação de Dados pelo Ministério do Trabalho

Publicado por Robéria Priscila Morais

Resumo do artigo

Recentemente, condomínios em Pernambuco receberam notificações do Ministério do Trabalho solicitando informações detalhadas sobre os moradores e seus empregados domésticos. Essa solicitação, segundo o Ministério do Trabalho, fundamenta-se no Art. 11 da Lei nº 10.593/2002 e no Art. 18 do Decreto nº 4.552/2002, levanta importantes questões sobre a aplicabilidade desses dispositivos legais e as obrigações dos condomínios no contexto da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

A Solicitação do Ministério do Trabalho

O Ministério do Trabalho enviou uma notificação pedindo que os condomínios forneçam uma planilha contendo dados pessoais dos moradores e relações particulares quanto a seus empregados domésticos. A fundamentação utilizada pelo Ministério está, segundo o seu entendimento, baseada na necessidade de fiscalização trabalhista, conforme previsto nos dispositivos legais mencionados.

Obrigações Legais dos Condomínios

1. Relação com Empregados Domésticos

Os condomínios têm obrigações trabalhistas claras em relação aos seus próprios funcionários, aqueles contratados diretamente pelo CNPJ do condomínio. Isso inclui o cumprimento de todas as normas de inspeção do trabalho. No entanto, empregados domésticos dos moradores não são contratados pelo condomínio, mas pelos próprios moradores, caracterizando uma relação de emprego privada e direta entre eles.

Desta feita, o Art. 14 do Decreto nº 4.552, de 2002, impõe aos empregadores, tomadores e intermediadores de serviços a obrigação de franquear acesso aos Auditores-Fiscais do Trabalho aos estabelecimentos e locais de trabalho, além de exibir documentos e materiais solicitados para fins de inspeção do trabalho. Este artigo se aplica diretamente ao condomínio na qualidade de empregador de seus funcionários (empregados do condomínio), mas não parece estender-se diretamente aos dados dos moradores.

2. Proteção de Dados Pessoais:

Conforme a LGPD (Lei nº 13.709/2018), os condomínios têm a responsabilidade de proteger os dados pessoais dos moradores e dos empregados domésticos. A LGPD exige que o tratamento de dados pessoais seja realizado com base em princípios claros, como o consentimento explícito do titular dos dados, a finalidade específica e a necessidade do tratamento.

LGPD (Lei nº 13.709, de 2018) impõe limites estritos ao tratamento e compartilhamento de dados pessoais, especialmente dados sensíveis. No caso dos moradores de um condomínio, seus dados pessoais não se enquadram na categoria de “dados necessários à execução de políticas públicas pela administração pública” conforme mencionado no Art. 11IIb da LGPD, uma vez que a relação não se refere a uma política pública diretamente aplicada a esses dados pessoais dos moradores.

Por fim, importante destacar que o condomínio não é o controlador/proprietário dos dados dos funcionários privados dos moradores, não existindo a possibilidade de tratá-los.

Limites Legais para o Compartilhamento de Dados

1. Consentimento Necessário:

LGPD estipula que o tratamento de dados pessoais, especialmente dados sensíveis, deve ser realizado com o consentimento explícito do titular (Art. 7º e Art. 11). Portanto, a solicitação do Ministério do Trabalho para obter dados pessoais dos empregados domésticos dos moradores sem o consentimento prévio viola esse princípio.

2. Princípio da Finalidade:

Os dados pessoais só podem ser coletados e utilizados para fins específicos, explícitos e legítimos. No caso da solicitação de dados dos empregados domésticos, não há uma justificativa legal clara que permita ao condomínio compartilhar essas informações com o Ministério do Trabalho sem infringir a LGPD.

3. Direitos Constitucionais:

Constituição Federal, no Art. X, protege a privacidade e a intimidade das pessoas, assegurando que qualquer violação desses direitos deve ser devidamente justificada e legalmente embasada. A solicitação indiscriminada de dados pessoais sem uma base legal sólida compromete esses direitos fundamentais.

Responsabilidade social

1. Limitações da Responsabilidade Social:

A responsabilidade social não possui força de lei para sobrepor-se às normas de proteção de dados. Embora possa orientar boas práticas, não substitui a necessidade de cumprir com requisitos legais específicos, como aqueles estabelecidos pela LGPD.

2. Necessidade de Consentimento:

LGPD exige o consentimento explícito dos titulares dos dados para o tratamento de suas informações pessoais, exceto em casos específicos que não se aplicam diretamente à situação descrita na notificação do Ministério do Trabalho.

3. Exigências Legais Específicas:

A solicitação de dados pessoais dos empregados domésticos dos moradores, sem base em uma obrigação legal clara aplicável ao condomínio, não encontra amparo nas normas de responsabilidade social. O condomínio não tem a obrigação legal de fornecer esses dados, a menos que exista uma determinação judicial ou uma disposição legal específica que obrigue tal compartilhamento.

Conclusão: Não Aplicabilidade dos Dispositivos Legais para o Caso Concreto

A solicitação do Ministério do Trabalho, fundamentada no Art. 11 da Lei nº 10.593/2002 e no Art. 18 do Decreto nº 4.552/2002, não se aplica diretamente ao compartilhamento de dados pessoais dos empregados domésticos dos moradores sem consentimento. As obrigações do condomínio são limitadas à relação de emprego com seus próprios funcionários e devem respeitar rigorosamente as disposições da LGPD.

Os condomínios devem adotar uma postura firme na proteção dos dados pessoais, garantindo que qualquer compartilhamento de informações seja feito em conformidade com a legislação vigente. A comunicação transparente com os moradores e a obtenção do consentimento explícito são essenciais para evitar violações de direitos e possíveis sanções legais.

Por fim, pode informar ao MT que o fornecimento dos dados solicitados não atende aos princípios de finalidade e necessidade conforme definidos pela LGPD, visto que a relação trabalhista dos empregados domésticos é diretamente com os moradores e não com o condomínio. Mas, o Ministério do Trabalho pode se comunicar diretamente com os moradores para obter os dados necessários, respeitando a legislação de proteção de dados e o condomínio está a disposição para facilitar esta tratativa.

Autor: Robéria Morais, Advogado Especialista em Direito Condominial

Instagram: Advogada.condominial

Fonte: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/solicitacao-de-dados-pelo-ministerio-do-trabalho/2554656889