Por Silvana de Oliveira – Perita Judicial, Grafotécnica, Especialista em Provas Digitais e Investigação Forense.
Em São Paulo, um dos maiores condomínios da Zona Noroeste — o Portal dos Bandeirantes, no Jardim Íris — tornou-se palco de um conflito generalizado entre moradores e a atual administração. Apesar da boa estrutura e do padrão elevado dos imóveis, denúncias de multas abusivas, perseguições e falta de transparência transformaram o dia a dia dos condôminos em uma verdadeira batalha por direitos básicos.
A situação ganhou tamanha proporção que os moradores recorreram à imprensa para reivindicar apoio e tornar públicas irregularidades que, segundo eles, vêm comprometendo não apenas a convivência interna, mas também a saúde financeira do condomínio.
A origem da crise: multas para quem questiona
Moradores relatam que qualquer tentativa de cobrar explicações ou questionar a gestão resulta em multas sucessivas, muitas delas consideradas sem fundamento. Há relatos de pessoas que acumularam mais de 20 multas, algumas ultrapassando R$ 1.000 cada, os motivos chegam a ser inusitados:
- “Flor na muretinha da porta”;
- “Atrapalhar o trânsito”;
- “Andar com pessoas não autorizadas”;
- “Ter uma frase na porta”;
- E até multas por situações em que o morador sequer estava no condomínio.
A sensação entre os moradores é clara: as multas se tornaram instrumento de intimidação e silenciamento.
Água com aumento de mais de 400%
Outra reclamação recorrente envolve as contas de água. Moradores relatam aumentos abruptos e injustificados casos em que o valor subiu de cerca de R$ 150 para R$ 800 em apenas um mês. Mesmo após verificações que descartaram vazamentos, o custo se manteve elevado. Para agravar o quadro, a empresa responsável pela leitura teria sido trocada sem autorização da assembleia, o que, segundo especialistas, viola a convenção condominial.
Suspeitas de irregularidades financeiras e gestão opaca
A falta de prestação de contas estruturada é um dos pontos que mais revolta os condôminos. As finanças estariam, segundo relatos, sendo controladas “no papel de pão”, sem planilhas, demonstrativos ou acesso às informações financeiras.
O condomínio já responde a uma ação da companhia de saneamento por uma dívida que ultrapassa R$ 1 milhão. Além disso, um áudio de uma ex-funcionária citado pelos moradores alimenta suspeitas de rachadinha: R$ 10.000 teriam sido transferidos para a conta dela e, posteriormente, repassados à conta pessoal do síndico.
A figura do síndico: ausências, denúncias e liminares
O síndico é acusado de não comparecer ao condomínio, não atender moradores e não cumprir suas obrigações de transparência e presença. Funcionários relataram à equipe de reportagem que é “difícil encontrá-lo”.
Uma assembleia realizada pela oposição chegou a aprovar a destituição do gestor. Contudo, uma liminar obtida por ele suspendeu os efeitos da assembleia, mantendo-o no cargo. Enquanto o processo judicial se arrasta, o clima interno se deteriora.
Para muitos condôminos, a postura do administrador que chegou a publicar vídeos chamando opositores de “ratos” e acusando críticos de mentir intensifica ainda mais os conflitos.
Casos extremos de perseguição
Entre os episódios mencionados está o de uma moradora de 85 anos que foi multada e processada criminalmente por coletar assinaturas para tentar instalar um posto de saúde na região.
Segundo os moradores, a intenção era comunitária; a reação da administração, porém, foi interpretada como nova forma de retaliação.
Insegurança jurídica e clima de tensão permanente
O condomínio se assemelha a uma pequena cidade, com mais de 13.000 moradores. No entanto, vive um cenário de insegurança jurídica, alimentado por:
- assembleias contestadas,
- liminares sucessivas,
- multas aplicadas em série,
- relatos de acordos milionários sem aprovação,
- e ausência de prestação de contas.
A presença da mídia serviu para abrir espaço ao diálogo ou ao menos para expor a dificuldade de obtê-lo. Nem mesmo a equipe de reportagem conseguiu localizar o síndico.
O que este caso revela sobre a gestão condominial no Brasil
Situações como a vivida no Portal dos Bandeirantes mostram como, em condomínios de grande porte, a falta de governança, transparência e mecanismos de controle interno pode desencadear ambientes de conflitos complexos.
Quando a administração passa a agir sem diálogo, sem prestação de contas e sem observância das regras da convenção, o condomínio deixa de ser um espaço de convivência e se transforma em um terreno fértil para:
- perseguições internas,
- judicialização permanente,
- insegurança sobre o patrimônio dos moradores,
- e — principalmente — perda de confiança na gestão.
a urgência de restaurar a transparência
O caso do Portal dos Bandeirantes é um alerta importante para comunidades condominiais em todo o país. A governança condominial não pode ser personalizada, opaca ou autoritária. A transparência, o acesso às informações e a participação da comunidade são pilares essenciais para evitar abusos, conflitos e prejuízos coletivos.
Enquanto a Justiça não define a validade da assembleia que afastou o síndico, os moradores seguem convivendo com o receio de novas penalidades e com a sensação de abandono administrativo — um retrato claro de como a ausência de controle e comunicação pode desestabilizar até mesmo grandes empreendimentos.
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