A evolução da proteção de dados pessoais no Brasil tem ganhado destaque significativo nos últimos anos, especialmente com a promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) em 2018, que entrou em vigor em setembro de 2020. O Supremo Tribunal Federal (STF) tem desempenhado um papel fundamental na interpretação e aplicação desta lei, ajudando a moldar um novo direito fundamental para os cidadãos brasileiros.
Proteção de Dados Pessoais como Direito Fundamental
Em 2020, o STF reconheceu a proteção de dados pessoais como um direito fundamental autônomo, em decisão histórica no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6387. Esta decisão estabeleceu um marco importante ao determinar que o direito à proteção de dados pessoais está intimamente ligado ao direito à privacidade e à liberdade, sendo essencial para a proteção da dignidade humana. A Corte afirmou que a proteção de dados pessoais não é apenas uma questão de regulação tecnológica, mas uma garantia constitucional essencial em um mundo cada vez mais digitalizado.
Principais Julgamentos
Desde a vigência da LGPD, o STF tem se debruçado sobre diversos casos que envolvem a aplicação da lei, ajudando a consolidar a jurisprudência sobre o tema. Entre os principais julgamentos, destacam-se:
- Compartilhamento de Dados entre Órgãos Públicos (ADI 6387 e ADPF 695):
Em um dos casos mais notórios, o STF suspendeu a Medida Provisória 954/2020, que autorizava o compartilhamento de dados de usuários de telefonia com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) durante a pandemia de COVID-19. A Corte entendeu que a medida violava o direito à privacidade e à proteção de dados, uma vez que não havia garantias suficientes de segurança e anonimização dos dados. - Cadastro de Inadimplentes (RE 601.314):
Outro caso relevante foi o julgamento do Recurso Extraordinário 601.314, no qual o STF discutiu a legalidade do compartilhamento de dados de inadimplentes com empresas de proteção ao crédito. A decisão reafirmou a necessidade de equilíbrio entre o direito à proteção de dados e o direito à informação econômica, estabelecendo limites claros para o tratamento de dados pessoais. - Marco Civil da Internet e Direitos Fundamentais (ADI 4039 e ADI 4040):
O STF também abordou a questão da proteção de dados pessoais no contexto do Marco Civil da Internet. Nas ADIs 4039 e 4040, a Corte reconheceu que a regulamentação da internet no Brasil deve ser compatível com os princípios da proteção de dados pessoais e da privacidade, garantindo que os direitos dos usuários sejam respeitados.
Impacto e Perspectivas
As decisões do STF têm sido cruciais para a consolidação da proteção de dados como um direito fundamental no Brasil. Ao estabelecer parâmetros claros para a aplicação da LGPD e ao reforçar a importância da privacidade na era digital, a Corte tem contribuído para a criação de uma cultura de respeito aos dados pessoais no país.
Além disso, essas decisões indicam que o STF está atento às rápidas transformações tecnológicas e aos desafios que elas impõem ao ordenamento jurídico, sinalizando a necessidade de uma interpretação dinâmica e evolutiva dos direitos fundamentais.
Com a LGPD completando seis anos em 14 de agosto de 2024, o Brasil se consolida como um dos países líderes na proteção de dados pessoais na América Latina, graças, em grande parte, à atuação do STF. A Corte tem garantido que a legislação seja aplicada de maneira a proteger efetivamente os direitos dos cidadãos, adaptando-se às novas realidades do mundo digital.
Em suma, o STF tem sido um ator central na evolução da proteção de dados pessoais no Brasil, ajudando a moldar um novo direito fundamental que, sem dúvida, continuará a se desenvolver e a se expandir nas próximas décadas.
STF e proteção de dados pessoais: decisões da Corte marcaram a evolução de um novo direito fundamental
Confira principais julgamentos em que o STF já se pronunciou sobre a Lei Geral de Proteção de Dados, que completa seis anos nesta quarta-feira (14).
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018), que regula a privacidade e o tratamento desses dados, completa seis anos nesta quarta-feira (14). A norma representa um avanço na regulação do uso de dados no mundo real e virtual, na medida em que altera e atualiza dispositivos do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), editado quatro anos antes.
A evolução tecnológica e seu impacto na vida das pessoas, empresas e governos, bem como a interação entre esses setores em nível global, exigiram melhorias na legislação sobre o uso da internet e dados pessoais. Com isso, o Direito precisou se atualizar para definir o que pode ou não violar garantias individuais.
Audiências públicas
No contexto de avanço tecnológico, modernização das leis e preservação de direitos fundamentais, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem se manifestado em processos relacionados tanto ao Marco Civil da Internet quanto à LGPD. O Marco Civil da Internet é a primeira norma brasileira que aborda a governança da internet e a proteção de dados pessoais no ambiente digital. Desde sua aprovação, o STF realizou quatro audiências públicas para discutir o tema.
A primeira ocorreu em junho de 2017, quando o Tribunal tratou do Marco Civil e do bloqueio do aplicativo WhatsApp por decisões judiciais (ADI 5527 e ADPF 403). A segunda, em fevereiro de 2020, quando tratou do controle de dados de usuários por provedores no exterior (ADC 51). Mais recentemente, a Corte discutiu a responsabilização civil de provedores pela divulgação de conteúdo ilícito gerado por terceiros e a remoção desse conteúdo da internet (RE 1037396 e RE 1057258) e o uso de ferramentas de monitoramento secreto de aparelhos de comunicação pessoal (ADPF 1143).
Confira abaixo os julgamentos importantes do STF sobre o tema:
Compartilhamento de dados na pandemia
Em 2020, o STF suspendeu o compartilhamento de dados de empresas de telefonia fixa e móvel com o IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Por maioria, o Tribunal reconheceu a proteção de dados como direito fundamental e explicitou balizas constitucionais mínimas e necessárias para a limitação desse princípio (ADIs 6387, 6388, 6389,6390 e 6393).
Cadastro antidrogas
Também em 2020, ao julgar lei de Tocantins, o Plenário invalidou a criação de um cadastro estadual de usuários e dependentes químicos. A Corte entendeu que matéria referente à política nacional sobre drogas é de competência federal e não cabe aos estados criarem um cadastro antidrogas próprio. Um dos pontos debatidos no julgamento foi a inexistência de protocolo claro de proteção e tratamento de dados pessoais, conforme estabelece a lei federal que regulamenta a matéria (ADI 6561).
Limite para compartilhamento
O compartilhamento de dados entre órgãos públicos deve ser restrito ao mínimo necessário à finalidade informada e seguir critérios rígidos para atender às exigências da LGPD. A decisão do STF foi tomada em setembro de 2022 e considerou ainda que devem ser observados o controle de acesso aos dados, a responsabilidade civil dos servidores por uso indevido e a segurança no tratamento e na guarda de informações cadastrais dos cidadãos (ADI 6649 e ADPF 695).
Banco genético
Em abril de 2023, no julgamento de outra lei estadual, desta vez do Rio de Janeiro, o STF invalidou a coleta compulsória de material genético no momento do parto para alimentar banco genético com informações de mães e bebês. A lei do RJ previa ainda que os dados cadastrados deveriam ficar à disposição da Justiça para serem utilizados em caso de eventual troca de bebês. Para a Corte, dados genéticos são considerados sensíveis e estão sujeitos à guarda mais cuidadosa, com rígido protocolo de segurança e privacidade (ADI 5545).
Provedores no exterior
Ainda em 2023, o Tribunal decidiu que autoridades brasileiras podem solicitar dados diretamente aos provedores de internet sediados no exterior para elucidação de investigações criminais, se essas empresas operarem no Brasil. Conforme o julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC 51), essa requisição está prevista no artigo 11 do Marco Civil da Internet e no artigo 18 da Convenção de Budapeste. A decisão inclui também a comunicação aos poderes Executivo e Legislativo sobre a necessidade de aprovação de uma LGPD Penal e de novos acordos de cooperação para regular a obtenção de conteúdo eletrônico.
Anulação de provas
Provas obtidas sem autorização judicial a partir de dados preservados em contas da internet são nulas e não podem ser usadas em investigação criminal. A decisão é de fevereiro de 2024 da Segunda Turma no Habeas Corpus (HC) 222141 e considera indevido o acesso ao conteúdo telemático de pessoa investigada sobre irregularidades no Departamento Estadual de Trânsito (Detran) do Paraná.
(Adriana Romeo/LM //AL)
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